domingo, 13 de dezembro de 2009

Meu maior prazer (Parte 3)

Por conta de complicações no transito, acabei chegando na estação do maracanã já um tanto atrasada, quase meia hora depois.Os vagões já estavam supervazios, como se não fosse nem dia de jogo. É claro. A torcida do fuderosão que assistiria o jogo no maior estádio do Brasil já se concentrava toda lá dentro. Eu era uma atrasada, que nem ao maraca iria, mas que estava gostando de perder o iniciozinho da partida, porque pra mim este é o momento mais neurótico de se enfrentar.
Giovanna estava exatamente no local em que marcamos, já preocupada com a minha demora. Tratamos de descer a rampa rapidamente, mas fomos abordadas por um policial que quis ver o que tinha dentro da minha mochila. "E olha que nem vamos entrar no Maracanã!", eu falei pra Gi!
Os arredores do estádio já estavam vazios, mas ainda havia alguns retardatários correndo para ver o início da partida lá dentro. Eu e minha comparça, andavamos tranquilamente em direção à 28 de Setembro, mas com uma certa invejinha daquelas pessoas que corriam para entrar no estádio. Eis que quando íamos atravessar a rua, surgem duas figuras conhecidas nossas: Negão e Markito, dois rubro-negros com alma de malandro da nossa amada faculdade. Eles estavam nas proximidades desde cedo, em busca de ingressos, mas assim como nós duas, não tinham tido coragem de dar 200 contos na entrada.Falamos pra eles que estávamos ali só pra ficar perto do burburinho e que íamos procurar um bar pra assistir a peleja, tentando convence-los a irem conosco. Meio à contragosto eles concordaram, mas antes pediram para que fossemos com até o portão 15, onde um ingresso aguardava um amigo sortudo que estava com eles. Topamos.
No meio do caminho fomos abordados por alguns cambistas e tentamos negociar com eles. Na verdade meus amigos tentaram, porque eu só tinha 20 pilas no bolso.Os cambistas foram duros e não fariam por menos de 150 contos. Negão, como bom pé de cana que é, disse que amava muito o Flamengo mas que com aquele dinheiro beberia até a manhã do dia seguinte. Eu concordei. Foi quando um dos cambistas perguntou quanto estávamos dispostos a pagar e Giovanna falou sem nenhuma pena daquele único galo que tinha no seu bolso: 5O REAIS!O sujeito, que era tão flamenguista quanto a gente, àquela altura queria mesmo era se livrar daqueles ingressos pra poder entrar no maraca. Especulação daqui, blablablá dali, ele arrumou 4 cadeiras azuis pra gente por um total de 240 reais. Eu e Gi pagaríamos 1 galo cada e os rapazes 70 contos. O cambista estava nervoso e falou que era pra decidirmos logo porque ele queria entrar.Nesse momento o jogo começava e os fogos explodiam dentro do maracanã, atrapalhando a comunicação entre todos nós. Cedemos! Pendurei na conta do Negão 30 reais ainda desconfiada da validade daqueles ingressos. "Se forem falsos vou ficar muito puto", exclamou Negão, pensando a mesma coisa que eu.
Não dava mais tempo de pensar. O destino nos tinha colocado ali, frente a frente naquele momento, e nos dizia que era pra gente assistir aquele espetáculo. Enquanto corríamos em direção à entrada acontecia dentro de mim uma explosão de sentimentos.Uma mistura de emoção com incredulidade e medo. "Senhor, será que eu não vou dar azar? Será que é mesmo pra eu estar lá dentro?Eu havia dito que só iria ao maraca se um ingresso caísse no meu colo e ele caiu!Acho que devo aproveitar! Não, não vou amarelar, afinal 'o rubro-negro não tem medo de morrer'. E além do mais, estava tudo okey. Eu estava com a calcinha da sorte, o tênis bicampeão carioca e a fé em São Judas Tadeu. Haveria de dar tudo certo". Entramos.

Ao passar da roleta eu não podia acreditar no que me acontecia! Meu Deus, eu estava dentro do Maracanã no jogo mais importante da história do Flamengo nos últimos 17 anos. E também estava no jogo mais importante da minha história com o Flamengo. Eu e meus colegas começamos a gritar de felicidade como uns loucos, ainda sem muita noção do que estáva nos acontecendo. Começamos a correr em busca de um lugar e acabamos parando bem atrás do gol do Grêmio naquele tempo, que seria o nosso gol, no segundo. Por conta da minha estatura eu não conseguia enxergar quase nada do que acontecia em campo, mas a vista do Maracanã repleto de rubro-negros apaixonados fez com que uma lágrima corresse dos meus olhos. Num momento um pessimismo forte me bateu, mas logo eu pensei que se Deus tinha me colocado ali era porque algo de muito bom me esperava.

O jogo não estava bom pra gente e a torcida se revoltava. Logo me dei conta de que não tardaria para tomarmos um gol e foi o que aconteceu. Mais uma vez um pensamento derrotista me passou pela mente por alguns segundos. Mas, rapidamente me lembrei da máxima que diz que pra gente tudo tem que ser no perrengue. Aquele gol, era na verdade uma coisa ótima que nos tinha acontecido, pois só assim o time acordaria. Olhei pro céu e disse pra São Judas Tadeu: "Eu ainda tenho fé no senhor!" Eu sabia que ele estava me provando. O gol não demoraria a sair, pois o time agora estava correndo atrás. Pela primeira vez saquei minha camisa rubro-negra velha de guerra da mochila e vesti como se fosse uma farda, como costumo fazer quando o Fla está perdendo. Nessa hora o Markito falou: Agora vai! Não demorou muito pro gol sair. Todos juntos explodimos de alegria. A vitória viria certamente.

O mais "engraçado" era que os resultados dos outros jogos tiravam o título da gente naquele momento. No entanto eu só conseguia pensar que os colorados deviam estar muito felizes, já comemorando o título, mas que a alegria deles duraria muito pouco. O gol estava demorando a sair mas eu e todas as pessoas ao meu redor, apesar do medo, tínhamos a certeza absoluta de que mais cedo ou mais tarde ia acontecer.O Inter era campeão naquela hora, mas bastava o Fla fazer só um golzinho pra alegria deles ir por água à baixo. Diferentemente do esperado o Grêmio não entregou o jogo e o caminho das pedras se mostrava cada vez mais pedregoso.Mesmo assim, ninguém desacreditou.
Quando o telão da Suderj começou a informar o número de pagantes, me bateu um desespero, afinal isso só acontece quando o jogo está no final! "Senhor! Não é possível que esse jogo tenha passado tão rápido! Um gol, meu Deus, só um gol!", eu pensava. Nessa hora eu já conseguia enxergar tudo o que acontecia em campo, pois fui empurrada bem pra frente da mureta... Gooooool!Ele saiu bem na minha frente! Foi um extase! Eu não conseguia gritar! Pulava sem acreditar no que meus olho viam! Era ao mesmo tempo um alívio e uma sensação de que ainda não tínhamos ganhado nada!A torcida explodia num espetáculo estético de dar inveja ao artista mais talentoso. Aqueles últimos minutos até o fim do jogo, foram os mais longos da minha existência. Não podíamos tomar um gol de jeito nenhum, o ideal era marcarmos outro, o título estava nas nossas mãos. Meu coração quase saía pela boca. Eu estava muda, estática, minhas pernas e minhas mãos estavam dormentes e tremiam. Eu clamava pelo amor de deus pra tudo acabar logo. O Grêmio insistia em atacar. Eu chorava como um bebê...

O juiz apitou! Acabou! Foi a catarse. O momento mais intenso que já vivi. Pra sempre na minha memória, o dia mais feliz da minha vida.

Saindo do Maracanã, a sensação que eu tinha era que tudo não passava de um sonho, que eu acordaria no dia seguinte ouvindo que o Inter foi campeão. Mas não era! A ficha é que ainda não tinha caído e, pra ser sincera, está caindo até agora.

SRN.

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